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terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Atualizações de um náufrago

Faz muito tempo que eu  não apareço aqui e muita coisa mudou na minha vida desde a ultima vez que escrevi. Escrevendo essa ultima sentença, percebo o quão engraçado é o fato de que as coisas sempre mudaram. Quando eu comecei esse blog em 2011, eu estava em meio a uma mudança e depois um monte de outras mudanças se seguiram e eu também acabei mudando e assumindo vários papéis nesse meio tempo. Mas os últimos dois anos mudaram completamente tudo em mim e isso talvez seja uma das coisas mais aterrorizantes da minha vida.

Eu não quero me aprofundar tanto nos fatos, mas de modo resumido, eu posso falar que  tudo mudou: Meus pais entraram em um processo de separação litigiosa, eu saí da minha cidade natal, terminei algumas relações pessoais e descobri que pessoas que eu amava muito não eram exatamente o que eu pensei que elas fossem. De certa forma tudo isso fez com que eu perdesse completamente qualquer noção de quem eu era e desconfiasse completamente da minha capacidade de entender o mundo a minha volta e a minha confiança. Tudo tinha mudado e de repente, eu me vi completamente sozinho e perdido. Por muito tempo eu senti e na realidade ainda sinto que alguma coisa dentro de mim se quebrou. De muitas formas, eu já não me sinto o mesmo e isso ainda me assusta.

A terapia tem me ajudado a me manter vivo, mesmo quando as vezes eu só consigo pensar em acabar com tudo. Existem manhãs que são mais difíceis que outras, mas eu sigo. Talvez não tanto pelos motivos certos, mas eu continuo aqui. Queria poder dizer que já me sinto inteiro e feliz e que as coisas vão bem, mas na realidade, acho que nunca me senti tão perdido. Fazem dois anos que eu não consigo sonhar de verdade. Não me sinto bom em nada e não faço mais planos. Não existe nada que eu realmente queira. Meus sonhos morreram alguns anos atrás. A única certeza é a mudança e eu tenho aceitado isso. Vivendo eternamente nessa corda-bamba, tentando equilibrar a vida para não machucar ninguém. Continuo vivo, mas a sensação de ser sempre menos.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

RECONEXÕES

Peter Paul Rubens- Vênus, Cupido, Baco e Ceres (1613)

Durante a minha infância eu fui criado dentro do catolicismo, aos 12 anos eu fiz minha primeira comunhão e após isso larguei definitivamente a igreja. Desde então, tenho me considerado ateu e nunca senti necessidade de me conectar com nenhum tipo de divindade ou me integrar a nenhuma religião. Recentemente, eu passei por um processo de redescobertas pessoais e entre os tópicos desse processo de redescoberta, eu percebi que a minha espiritualidade era algo que na realidade ainda possuía alguns pontos de soltos.

Nos últimos seis meses, um processo natural de “chamamento” a uma forma de espiritualidade me ocorreu. Desde criança eu tinha uma ligação muito forte com a natureza. Essa minha conexão se deve ao fato de que durante toda a minha infância, eu passava os meus finais de semana e férias oscilando entre as casa dos meus avôs e o sítio do meu pai. Nesses espaços, eu estava completamente imerso no mundo natural, longe de todo a lógica que rege uma vida urbana. Eram espaços para experimentação e contemplação da vida dentro de todos os seus processos, desde o nascimento de filhotes de animais a germinação do solo, a morte e todos esses processos que acontecem na vida, mas que muitas vezes por estarmos tão distanciados dessa percepção que a zona rural nos oferece, acabamos não percebendo.

Por volta dos meus 14 anos, eu fui perdendo esse contato com esse meu lado rural, pois as cobranças do cotidiano e os meus projetos pessoais foram me distanciando dessa minha faceta. Nos últimos meses, e talvez, isso seja resultado de um longo processo de distanciamento de uma concepção de vida pautada por inúmeras coisas danosas correntes em nossa sociedade, coisas essas que eu tenho pontuado diversas vezes durante o período em que eu escrevo nesse blog, me fizeram perceber que talvez fosse a hora de parar um pouco, respirar ares mais puros e me reconectar com esse meu lado espiritual adormecido.

Tendo isso em vista, segui o conselho de Rilke em “Cartas a um jovem poeta” e vasculhei dentro da minha alma as minhas necessidades. Voltei para minha infância e adolescência e percebi como muita coisa dentro desse  processo de assumir responsabilidades  e crescer acabaram me levando para longe coisas que faziam parte de minha essência. Foi a partir desse momento que eu tomei uma retomada de consciência de mim mesmo e das coisas que eu precisava para ser feliz e entre esses pontos, a minha reconexão com esses ciclos da natureza se fez presente e me calou fundo.

Desde então, tenho me dedicado a estudar as religiões da terra, para compreender melhor esse tipo de espiritualidade, e ainda que eu não me veja como integrante de nenhuma religião oficial, eu começo a enxergar o mundo e a própria questão da “divindade” que para mim sempre foi uma coisa muito confusa através de uma nova perspectiva. Alguns autores tem me ajudado nesse processo e para ser mais preciso, acho que seja necessário citar dois nomes,o primeiro deles é Fritjof Capra que é um físico e teórico austríaco, residente nos Estados Unidos que tem dedicado a sua vida a escrever livros de propaganda do “pensamento sistêmico”, isso é, uma nova forma de pensar a realidade, diferente do modelo herdado através de um concepção "reducionista-mecanicista" fruto do pensamento dos filósofos da Revolução Científica do século XVII, pensamento que ainda que em processo de declínio, pode ser considerado ainda como o modelo vigorante de pensamento na sociedade ocidental contemporânea. Nesse sentido, o pensamento sistêmico sério então uma antíteses do pensamento reducionista-mecaniscita, que é descrito pela Wikipedia da seguinte forma: 

“O pensamento sistêmico não nega a racionalidade científica, mas acredita que ela não oferece parâmetros suficientes para o desenvolvimento humano e para descrição do universo material, e por isso deve ser desenvolvida conjuntamente com a subjetividade das artes e das diversas tradições espirituais.”¹

O segundo autor é o Scott Cunningham, um escritor que tem como temática principal a Wicca e outras praticas religiosas alternativas. Boa parte de sua obra é dedicada aos chamados “praticantes solitários” (Uma modalidade religiosa comum dentro da Wicca, e que durante muito tempo foi bastante criticada dentro da própria religião, já que inicialmente a Wicca era uma religião exclusivamente iniciática.). Mas o que há de mais inovador entre todos os aspectos da sua obra, e é o que mais chama atenção, é o incentivo que Cunningham faz ao processo de obtenção de conhecimento e vivência espiritual através da leitura/estudo, da observação e da experimentação. E nesse sentido, ele defende a ideia de uma liberdade espiritual enorme por assumi que o processo de conexão com a espiritualidade é um processo individual, onde cabe a cada um encontrar a melhor forma de se reconectar com seu lado espiritual.

quinta-feira, 6 de março de 2014

Para alguém que se foi...

Acho que nosso crime já transcreveu e por isso não vejo problema algum em falar sobre ele. Talvez eu devesse ter motivos, mas depois de tanto tempo não acho que tenha motivos para guardar nada, especialmente depois de ter superado. Pode parecer que não, afinal estou escrevendo sobre isso, mas na realidade eu acho que eu precisava deixar claro para você tudo o que ocorreu e também tudo o veio depois. Não que eu te deva alguma explicação, a gente nunca deve explicação a ninguém e você mesmo não me deu explicação alguma naquela noite em que você veio até a minha porta e sem olhar para minha cara, me devolveu todas as coisas que eu tinha te emprestado ou te dado. Eu sei, parece rancoroso guardar com tamanha minucia cada um desses momentos e qualquer um que leia esse texto deve pensar que eu ainda morro de amores por você, mas a verdade é que guardar memórias e transformá-las em textos depois é um das formas que eu tenho para conseguir exorcizar meus demônios.

Estou escrevendo, pois recentemente me aconteceu uma situação uma pouco parecida apesar de que dessa vez ninguém quis ir embora, ou me deixou sozinho no portão. Dessa vez fui eu quem resolveu se afastar. Não sei, acho que você me fez ficar um pouco covarde. Estive lembrando aquela noite em que assistíamos as The Runaways, e das semanas seguintes, logo depois daquele carnaval em que você me cortou completamente por dentro. Lembro-me das longas semanas em que “Love Is Pain” era a única coisa que eu sabia ouvir ou cantar e daquela canção triste que eu escrevi depois de tudo. Inclusive, venho te informar que tenho trabalhado em um EP e sinto muito, mas ele fala muito de você e logo todo mundo vai poder ouvir aquelas musicas que eu escrevi enquanto você me fazia amargar.

Da ultima vez que nos encontramos você queria que eu fosse amigável, mas eu nunca conseguiria ser amigo de alguém com um caráter tão duvidoso quanto o seu. Eu também tenho trabalhado em um documentário, mas não sei quanto tempo ele e o EP vão demorar em ficarem prontos, mas de certo modo acho que tanto o EP quanto o documentário ficarão prontos no momento em que for para ser. Eu continuo seguindo o meu ideal de só fazer as coisas quando tenho paixão e agora estou envolvido com essa ideia. Eu também tenho uma agenda nova, comecei a registrar meus novos dias, eles não são mais gloriosos como os dias de antes, mas tenho que admitir que eu atualmente ande saindo mais e que de certa forma isso tem me rendido bons momentos.

O documentário não é sobre você, ele é sobre mim. Talvez eu te cite em algum momento. Na realidade, o documentário não é sobre mim, mas sobre todos nós. Ele é sobre uma ideia que vem me acompanhando desde que esse angustiante caminho começou. Eu diria que é um documentário sobre a dor de crescer. Mas também não é apenas sobre isso. Acho que é sobre a jornada. E nós ainda temos muito pela frente.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Afinal, o que é um artista?

Estive me questionando esses dias sobre qual o papel do artista no mundo e qual a utilidade da arte. Por um longo período eu tive a ideia de que a arte era resultado da pura projeção de uma ideia para um meio material, mas nos últimos 7 anos eu tenho me dado conta de que na realidade, muito além de uma simples projeção imagética, a arte é fruto de uma longa serie de "saltos imaginativos"  que através da manipulação material ou sua simples execução provocam no publico uma mudança emocional, uma alteração de consciência e em certo sentido uma completa mudança no plano existencial¹.


Piet Mondrian. Composição em Vermelho, Azul e Amarelo. 1930. Oléo sobre tela, 51cm x 51cm. Coleção de Sr. e Sra. Armand P. Bartos, Nova York



Tendo isso em mente, eu comecei a me perguntar como essa minha conceptualização sobre mudança de status emocional ou mesmo de consciência pessoal poderia se aplicar no trabalho de artistas como Mondrian ou Polock que não se limitaram a reproduzir imagens de objetos ou coisas que existem no plano real de existência, ou no plano da vida cotidiana. Como as composições de Mondrian  repletas de quadrados e retângulos ou as manchas de tintas de Polock poderiam emocionar o observador ou mesmo muda a sua consciência de si?

Cheguei à conclusão de que mesmo não reproduzindo algo que pertença ao "plano real", a arte desses artistas apresentam um lado humano que está presente em outras obras. Para avaliar isso decidi fazer uma espécie de histórico da evolução temática da arte.

Judith Leyter. Menino com Flauta.1630-1635. Óleo sobre tela, 1,60mX2,49m. Museu Nacional, Estocolmo.
Inicialmente se tinha a ideia de que apenas os grandes temas deveriam ser representados e entre esses “grandes temas” estavam inseridos os grandes heróis, os deuses da mitologia greco-romana e cenas e personagens bíblicos. Por volta do século XVII, a arte ocidental (sobretudo com o trabalho de artista holandeses como Judith Leyster, Frans Hals, Rembrandt entre outros.) começa a inserir ainda que timidamente imagens do cotidiano, paisagens e naturezas mortas, e esses novos temas passam também a compor grandes pinturas, e que para além disso a representação do não humano através da representação de paisagens e natureza morta incorporavam a percepção emotiva do artista com relação a natureza e o mundo que o cerca. Nesse sentido, percebeu se que a dimensão humana na arte não estava confinada a representação do ser-humano, mas que essa dimensão também é perceptível na visão do artista e não somente naquilo que ele simplesmente representa. 

Vincent Van Gogh, Campo de Trigo com Corvos, Óleo sobre tela 50,5 cm X 103 cm. Van Gogh Museum. Amsterdã.
Embora o elemento representado também tenha bastante importância em uma obra, a atividade de construção e a capacidade de projeção imagética e a própria realização da  obra lhe conferem humanidade. Nesse sentido os trabalhos de Pollock e Mondrian, ainda que não sejam os primeiros trabalhos do que acabou sendo conhecido como “ARTE ABSTRATA”, demonstram uma nova forma de enxergar e experimentar o mundo.  Essa nova forma de enxergar o mundo só poderia nos ser possível no século XX.

Jackson Pollock. Um (Numero 31,1950). 1950. Óleo e tinta esmaltada sobre tela, 2,69 m X 5,32m. MoMa, Nova York.

O dadaísmo representa a grande ruptura artística da nossa época, o movimento que surgiu por volta de 1916 na cidade de Zurique e que era liderado por artistas como o poeta judeu Tristan Tzara , Hugo Ball e Hans Arp, questionavam através das suas obras totalmente nonsense a irracionalidade de uma época marcada pela guerra. Segundo Jorge Glusberg em “A arte da Performance”, o futurismo, a intervenção artística  “Untitled Event”, organizada pelo  compositor, teórico musical e escritor americano John Cage, assim como também a Action Paiting do anteriormente citado Jackson Pollock foram essenciais para o surgimento do que hoje conhecemos como “Performance Art”.

Yves Klein. Salto no Vazio. 1962. Nice, França.

Surgida na década de 60, a performance art é um mudança total na forma como produzimos  arte.  A arte da performance  destruí a ultima fronteira entre obra e criador ao colocar o próprio artista dentro da obra. Mas como alerta Glusberg:

 “Pode-se talvez, a partir daí chegar a conclusão de que este tipo de arte enfocada é uma arte egomaníaca. O artista usando a si próprio exclusivamente como material- conteúdo, deve ser pensado como uma extrema manifestação de seu ego artístico. Contudo, se este é o caso, então tais artistas estão trilhando um caminho totalmente errado. Sua performance-body art  não  é glorificante. Nem é pessoal, no sentido que a própria personalidade do artista que se torna o assunto. Como manifestação, estes  trabalhos não expressam nada que não seja do artista como individuo. , como pessoa, como emoção. Se alguma coisa em oposição é verdadeira, é que estes trabalhos devam se parecer muito com os trabalhos da época ancestral, do clima não controlado, e serem na verdade proposições antiegóides.” ( GLUSBERG. P.145)

Sendo assim, a arte da performance desempenha um papel vital  na nossa sociedade, pois através da ação do artista, ela busca tratar de temas universais que refletem sobre o modo em que vivemos, nesse sentido,  a arte da performance é  uma nova forma de fazer arte, mas ainda assim trabalha com questões profundas sobre a alma humana.

Não é de se estranhar que trabalhos como o da artista performática Marina Abramovic tenha ganhado tanto prestigio e nos últimos anos. Em 2010 ela foi convidada pelo Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), para realizar uma exposição retrospectiva sobre o seu trabalho, Marina não apenas aceitou, mas decidiu produzir uma nova performance que teve a duração de 3 meses, a nova performance que também deu nome da exposição “The Artist Is Present”,  consistia na simples ação da artista em se sentar em um cadeira durante 7 horas por dia enquanto o publico era convidado a sentar-se pelo tempo que quisessem em uma cadeira colocada em frente a cadeira da artista . Como Marina fala no documentário produzido pela HBO, “MARINA ABRAMOVIC: THE ARTIST IS PRESENT”, uma das principais questões desse trabalho é mostrar como é difícil em nossos tempos realizar algo que parece ser tão simples: Permanecer quieto. A artista então, se utiliza da performance para questionar o publico sobre a nossa obsessão pelo movimento. Como podemos observar pelo documentário, a performance no MoMA teve como principal mérito o poder de emocionar e em certo sentido mudar psicologicamente a experiência do publico.


Se eu pudesse definir exatamente qual o papel da arte e do artista na nossa época, eu diria que o objetivo principal da arte seria provocar  nas pessoas  a percepção de que temos a cada dia nos afastados da nossa consciência sobre nós mesmo e que para além do discurso capitalista ou socialista, existe um individuo que deve buscar respostas na sua própria experiência individual, na exploração e no contato com os mais diversificadas elementos culturais.
Nesse sentido, a arte deve ser engajada no sentido de fazer as pessoas perceberem que  elas não precisam participar de um grupo fechado, de um partido politico, reproduzir um padrão "fashion", ou participar de uma tribo urbana para se definir. Mas  talvez aplicar a ideia existencialista como apresentada por Jean Paul Sartre em suas próprias vidas através do que eu talvez chamaria de “pesquisa referencial existencial continua.” O que implicaria em um modelo de vida mais experimental e desprendida de pura e simples reprodução de cacoetes sociais, e que por si, implicaria na possibilidade de desenvolver as mais diversas capacidades do individuo

1-Existência aqui compreendida no sentido Satriano.

Referências:

SARTRE, Jean Paul; FERREIRA, Vergílio; FORTES, Luiz Roberto Salinas; PRADO JÚNIOR, Bento (Trad.). O existencialismo é um humanismo; A imaginação ; Questão de método. São Paulo: Abril Cultural, 1978. 191 p.

GLUSBERG, Jorge. A arte da performance. 2. ed. São Paulo, SP: Perspectiva, 2009 145 p

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Eu, Rilke, Sartre, Van Gogh e Lady Gaga.

Essa ano eu comecei a escrever em uma agenda, eu entendo que esse espaço virtual funcionaria perfeitamente como agenda, mas acho que existe sempre aquele pontinho que você prefere guardar para você mesmo. Não que eu tenha medo de algo na minha vida ou que eu tenha algo para esconder, mas é muito mais aconselhável deixar a vida particular no particular. Ano passado eu fiz muitas observações sobre o meu cotidiano e sobre as pessoas em volta de mim por aqui, e eu pretendo continuar fazendo isso, mas agora, eu sinto que é necessário criar para mim um espaço onde eu possa ter um pouco mais de privacidade e liberdade para exprimir o inexprimível.

Detalhe de autorretrato de Vincent Van Gogh, Olho sobre tela, 1889

Nos primeiros dias desse ano, todo o drama do ano passado pareceu desmanchar-se completamente através dos meus olhos, mas a paz que reinou durante os primeiros 14 dias começou a ser remexida com situações que me levam novamente a repensar a nossa existência. O fato é que toda vez que eu me encontro em situações difíceis, eu me volto para a vida e a obra das pessoas que me inspiram e faço reflexões sobre minha própria existência. Hoje resolvi revisitar Rilke, Satre, Van Gogh e Lady Gaga, pois eu percebo que cada um deles, ao seu modo tentaram superar seus problemas com o que sabiam fazer de melhor. 

Inicialmente gostaria de começar por Van Gogh, o que me interessa aqui é falar sobre a sua crise existencial, sua solidão e o seu processo em meio a "loucura". A minha leitura de Van Gogh me aproxima muito do humano por trás do artista, as leituras de algumas das poucas páginas das cartas que ele escreveu para o seu irmão Théo, me fez perceber esse lado humano, solitário, amedrontado e apaixonado pela vida de uma pessoa incompreendida que ao fim acabou cometendo suicídio.

Nas longas e profundas cartas que escreveu para seu irmão, Théo, Van Gogh confessa a sua paixão pela literatura. Só os livros e as cartas o distraem de sua obsessão. Para, além disso, tudo é solidão e a tentativa de aprender a aceitar sua doença. A loucura o desgasta, o fatiga. Seus poucos momentos de lucidez são cautelosos, ele precisa se alimentar e pintar. O dramático contraste com Théo é perceptível  através da miséria do hospício, que ele mesmo descreve com grande realismo. Tirando a pintura, nada é logico.

GOGH, Van. Doze Girassóis numa Jarra. Óleo sobre tela. 91cm x 72cm. 1888

Sua obra é marcada por um duplo caráter, de um lado a “materialidade” e do outro a “metafisica”. Mesmo em suas naturezas-mortas podemos perceber paixão, raiva e compaixão. Simultaneamente violência e ternura. 
Van Gogh, que em vida só conseguiu vender uma única tela, e que depois de morto foi transformado em um dos artistas mais importantes e mais caro no mercado internacional de arte é um dos caso mais trágicos na história pintura.

Analisando esses fatos da nossa vida cotidiana, a mesquinharia, a nossa condição humana (demasiadamente humana, como escreveu Friedrich Nietzsche), eu tenho me prendido cada vez mais a ideia do filósofo Jean-Paul Sartre, que afirma que a existência precede a essência. As minhas leituras de parte da obra de Sartre tem me ajudado a superar parte dos meus anseios e frustrações. Aliado a isso, a leitura da obra do poeta Rainer Maria Rilke (sobretudo "Cartas para um Jovem Poeta"), tem me ajudado a explorar e questionar profundamente os meus desejos e a cutucar e colocar sal nas minhas feridas.

Lady Gaga é um outro referencial de vida. Ela é o tipo de pessoa que é extremamente amada e ao mesmo tempo odiada por muitos e desde o começo de sua carreira, ela tinha ambição de se transformar em alguém que tivesse potencial de transformar as pessoas ao redor. E de fato ela fez. Em 2011, quando lançou o seu mais que adorado/odiado/criticado e incompreendido Born This Way. Os ouvintes de musica pop não conseguiram compreender muito bem todo aquele inferno musical com vocais pesados e uma infinidade de guitarras. O disco em si lembram mais os clássicos de rock dos anos 70 e 80 que musica pop dos anos 2000.

Lady Gaga por Nick Knight
Com seus refrões grandiosos, batidas audaciosas e participações de integrantes do Queen e da E Street Band, Born This Way é a sua maneira, o mais próximo que Lady Gaga chegou de um album de rock. "Um monte de guitarras não constitui rock", ela afirma. "Tem a ver com o sentimento e o espirito." Gaga gravou quase todo o disco em um ônibus equipado com estúdio - "indo pela estrada, com o vento no cabelo, liberdade total e absoluta".(HIATT. p 67)

Entretanto, o espirito de transgressão do disco não está apenas na sonoridade, o tal sentimento e espirito ao qual Gaga se refere na entrevista para a Rolling Stone Magazine é perceptível durante todo o álbum.  De Marry The Night à The Edge of Glory, Born this Way desmiúça a visão de uma artista sobre um mundo que faz de tudo para nos fazer menores do que realmente somos. Nesse sentido o álbum é transgressor por tentar incentivar as pessoas a fazerem com que elas sejam exatamente aquilo que elas são.

"EU SÓ  QUERO SER QUEM SOU E QUERO QUE VOCÊ ME AME POR ISSO.¹"

Born This Way vendeu mais de 1 milhão de cópias e sua mensagem foi divulgada por praticamente todo o mundo durante uma turnê que durou praticamente um ano e que acabou abruptamente quando Gaga revelou publicamente em Fevereiro de 2013 que iria cancelar a turnê por causa de um rasgo labral em seu quadril que a impedia de seguir com a turnês adiante. O fato é que a mensagem de Born This Way rodou por todo o mundo e se ela tem impacto suficiente para modificar o mundo com alguns Little Monsters sugerem, eu não sei. O que de fato ocorreu é que a experiência de quase um ano do trabalho pesado de divulgação sobre esse disco provocou em mim uma mudança perspectiva sobre mim mesmo e sobre o mundo ao meu redor.
Born This Way não acabou com a fome na África, não trouxe a cura para a AIDS (apesar de Gaga tocar no assunto com Electric Chapel), mas ele revolucionou o meu mundo ao fazer reviver em mim o espirito de rebeldia em defender e ser quem eu sou, pois eu nasci desse jeito. Não há nada de novo em Born This Way além do que eu já sabia, mas ele reativou aquele grito de liberdade individual que estava se calando lá dentro. Como a própria Gaga declarou:

"Born This Way é a minha resposta para muitas questões ao longo dos anos: Quem é você? De que fala você? [...] O tema mais supremo na gravação é eu tentando entender como posso existir como eu mesma, como alguém que vive entre a fantasia e a realidade ao mesmo tempo. (GAGA)"

Quem somos? Para que servimos? Para onde vamos? Todas essas questões e muitas outras sempre aparecem para a gente uma hora ou outra. Elas são essencialmente humanas e todas as culturas tentaram de alguma forma resolver essas questões seja através do mito, da arte ou da ciência. Quando eu olho em retrospectiva para o meu caminho até agora, são exatamente esses perguntas que me vem, mas a vida me deu respostas e Born This Way me deu um caminho. Quando eu olho para mim todas as manhãs no espelho do banheiro, a unica resposta que me vem em mente é "Eu estou aqui e eu nasci desses jeito". Não existe resposta mais poderosa que essa para mim.

¹ Trecho da canção "Hair" presente no album Born This Way

REFERÊNCIAS

HIATT, Brian. Deusa Monstro-Unicornios, sonhos sexuais e a revolução dos estranhos: Por dentro do mundo irreal de Lady Gaga. In: Rolling Stone Brasil. Edição Nº 57. Junho de 2011 

Lady Gaga Says Born This Way Is 'My Answer To Many Questions'. Disponível em: http://www.mtv.com/news/articles/1664019/lady-gaga-metro-editor.jhtml  Acesso em: 08/03/2014

domingo, 29 de setembro de 2013

MEU CORPO É UMA PRISÃO- ME TIREM DAQUI.

Eu me senti pressionado. Acho que de certa forma todo mundo se sente assim por algum motivo. Obviamente a universidade e a incerteza sobre o meu futuro profissional tem 60% de culpa sobre essa pressão, mas existe uma energia maléfica, sombria e demasiadamente pesada em torno da minha vida. É angustiante e eu não sei exatamente como explicar. De alguma forma, essa energia tem me impulsionado a trava uma batalha interna em que nenhum dos dois lados parece ganhar. Existe esse sentimento interno que me diz que eu não posso escapar. 

Às vezes, acho que se eu não me importasse tanto com as coisas, tudo poderia ser bem mais fácil ou até mesmo mais suportável. Quando a sua cabeça está te deixando deprimido, ou cheio de dores, a ponto de estragar a “sua dança”, ela começa a se tornar uma gaiola. Descarte disse: “Penso, logo existo”, e dessa forma acabou decretando que a mente é a grande charada da existência. O fato é que minha mente esta totalmente fodida. Isso quer dizer que minha existência, ou me sentimento de existir ou fazer parte de alguma coisa também está. 

As coisas acabam se tornando existencialmente mais frustrantes quando percebemos que é basicamente impossível ter controle sobre as situações. Mesmo quando se trata de sua própria vida, você não tem 100% de autonomia. Dentro de certo contexto, eu estou sempre nessa jornada, em busca de alguém com quem eu possa me conectar. Pois nem sempre estar perto é perto o bastante. 

Dentro de um contexto sexual, quando estamos a ter relações sexuais com alguém que amamos – no meu caso, isso é mera especulação - não há o sentimento de que queremos chegar o mais perto da pessoa o possível, conectar se de uma maneira tão profunda e física o possível? Estar dentro de alguém ou ter alguém dentro de você não pode nunca ser o bastante, já que obviamente a pele e as estruturas faciais separam cada indivíduo em zonas espaciais distintas. Você já quis rasgar o rosto de alguém enquanto o beijava para se sentir um pouco mais conectado? Como uma espécie de tentativa genuína de fusão fora da realidade mundana de sua residência cotidiana (ou seja, seu próprio corpo?).

Esse desejo humano para o que tem sido chamado de “corpo aberto” tem sido pesquisado e tratado por um grupo bastante radical de filósofos do século 20 (Maurice Merleau-Ponty, Georges Bataille, Michel Foucault, Slavoj Žižek). Foucault particularmente é do meu interesse, especialmente por ele apresentar um grande fetiche pelo pratica sexual sadomasoquista. Essa pratica visceral e em alguns casos sangrenta permite a sensação de ter o corpo aberto e acessível para as outras pessoas ao redor. Além disso, ele gostava de se envolver em tal pratica no que ele chamava de lugares de “não identidade”, no qual os indivíduos anônimos experimentavam se conectar através de sua “carne crua” (estamos falando de sangue e outros fluidos corporais!) para escapar do fato solitário dos seus corpos isolados.

Do mesmo modo, artistas performáticos ao longo do século 20 - muitos deles com condições médicas graves - têm visceralmente respondido a esta escola do discurso. O trabalho de Ron Athey - um artista performático gay sadomasoquista, encenou as implicações do HIV no corpo. Sua obra mais impactante, em minha opinião, é a sua subversiva reencenação do martírio de São Sebastião (1990): nu, expondo seu corpo tatuado, enquanto assistentes perfuram sua pele - incluindo o seu rosto - com setas de metal, provocando fluxos de sangue que caiam ao chão. 
(PS: só assista ao vídeo se tiver estômago forte)


O erudito Robert Mills, pesquisando a natureza da dor e do prazer na iconografia hagiográfica - mostra que os mártires medievais "concebiam seus corpos como uma prisão da qual eles desejavam escapar... denegrindo as sensações da carne, a fim de afirmar o poder do espírito", Athey, pelo contrário, constrói uma tentativa propositadamente falha de alcançar qualquer forma de transcendência metafísica. Com quanto mais setas ele é perfurado em um esforço para abdicar sua própria estrutura física, mais a gravidade zomba de tal transcendência impulsionando sua carne e sangue físicos a caírem no chão da galeria. Seu corpo está aberto, sim, mas não a qualquer coisa acima - apenas um mundo imanente e demasiadamente carnal abaixo dos seus pés.
SAINT SEBASTIAN- GERRIT VAN HONTHORST

Controversamente, o seu sangue “infectado” muitas vezes se infiltra no espaço do espectador, causando indignação e às vezes, invocando a ilegalidade. Na abertura de seu próprio corpo para o mundo exterior, os “outros” são suscetíveis à infecção (ainda que dessa forma, a transmissão do HIV seja quase impossível). Essa é sem duvida uma das suas performances mais pungentes e faz cair por terra à ideia de que o nosso corpo é completamente fechado para o mundo exterior.

Eu fiz essa grande volta( talvez totalmente desnecessária e cansativa) para falar sobre o bom e velho discurso sobre a “imagem”  e a “essência”. Minhas ultimas analises sobre o tratamento que as pessoas costumam me dar me fizeram perceber que talvez, estejamos todos viciados na “imagem”. A imagem poderia significar alguma coisa se ela não fosse ambígua. É por isso eu me sinto preso dentro do meu corpo. Eu me sinto preso dentro da minha imagem. Se eu pudesse por um momento escolher uma imagem para mim, eu escolheria uma imagem que reflita o meu consciente interno. Seria uma imagem que apresentasse uma ideia clara sobre quem eu sou. Talvez esse texto seja desnecessário e a minha unica necessidade seja sair para fazer comprar, mas eu não sei, talvez a minha questão existencial sobre a dicotomia entre minha imagem e o meu âmago não possa ser resolvido comprando uma bermuda Calvin Klein ou uma camisa Tommy Hilfiger.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Relembre

Não tenho me sentido bem durante esses dias, acho que é a depressão de férias voltando. Mas quando me sinto assim costumo arrumar o meu quarto. Hoje enquanto arrumava os papeis que estavam guardados em uma gaveta achei alguns textos interessantes, e decidi compartilhar um deles com vocês. Esse se chama "Relembre" e diz assim:

"Pensando em nossa história do inicio até o fim, me pergunto: por que tudo deveria sumir? Relembre o tempo que tivemos e as coisas que partilhamos. Porque deveríamos evitar? Quanto tempo podemos continuar fingindo que não há nada errado enquanto tentamos nos esquecer? Porque nós nos escondemos de nós mesmo? Você sabia que nós não iríamos dar certo e então partiu. Eu não tinha certeza disso e talvez seja por isso que ainda estou esperando. Embora eu posso estar dolorido por dentro, eu vou ficar aqui. Pois ainda que minha cabeça diga: Siga em frente, o meu coração não me deixa partir.”

Achei bem apropriado dividir com vocês esse texto, pois estive falando com alguns bons amigos sobre as coisas do meu coração por esses dias e sobre como eu me sinto inseguro a maior parte do tempo com relação aos relacionamentos. Às vezes, eu gostaria de saber o motivo pelo as pessoas que me interessam nunca sentem o mesmo por mim. Seria minha aparência? Seria minha personalidade?
Odeio essas perguntas que nunca consigo achar respostas. Mas enfim será que algum dia, alguém irá corresponder aos meus sentimentos?

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Amanhã

Hoje é o dia perfeito para começar um blog. É a véspera do primeiro dia da minha vida adulta. Quero dizer, amanhã, sai um dos resultados mais importantes da minha vida: Vou passar quatro anos e meio na faculdade ou simplesmente vou colocar o currículo atrás do braço e começar  a andar por ai procurando emprego? Bem, em qualquer um dos casos, sei que  amanhã vai ser um dia importante na minha vida. Um dia que vai mudar tudo completamente.  Isso é assustador e fabuloso ao mesmo tempo.  Afinal, quantos são os dias em que a gente pode dizer: Foi aquele dia que mudou tudo?

Eu tenho medo de que eu acabe entrando em um caminho na minha vida em que as coisas sejam enfadonhas e eu não consiga mais ser como sou agora. Eu tenho medo de entrar por um caminho aonde eu nunca mais volte a criar, aprender ou experimentar coisas novas.  Tenho medo de ser obrigado a tomar uma rota em que as obrigações do cotidiano me empurrem para um lugar repetitivo, monótono e sem espaço para viver e criar plenamente.  Eu posso estar sendo pessimista agora, mas é fácil ser pego se iludindo com um futuro reluzente. Estou fazendo o  melhor que posso para ter tempo de apreciar o momento, porque agora é a única coisa que é real.